segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Nós vamos invadir sua praia

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Revista ISTOÉ Dinheiro - 17/10/2011
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De olho no potencial da nova classe C, empresas como Sorridents, TIM, Casas Bahia, Bradesco e Banco do Brasil se instalam em comunidades carentes.
Rafael Freire
A mais nova clínica odontológica da rede de franquia Sorridents segue a risca todos os padrões das demais 126 unidades espalhadas pelo Brasil. Piso de porcelanato, equipamentos de última geração e até revistas de luxo, de decoração e tecnologia na sala de espera deixam o ambiente aconchegante e preparado para atender os cerca de 400 pacientes que fazem consultas mensalmente no estabelecimento. Embora a estrutura e a forma de trabalho sejam iguais a de qualquer clínica da Sorridents, a unidade inaugurada há um mês tem uma peculiaridade: está no centro da comunidade de Paraisópolis, uma das áreas mais pobres da cidade de São Paulo, uma espécie de enclave de baixa renda no bairro nobre do Morumbi. "As classes populares estão gastando mais com saúde", disse à DINHEIRO Carla Sarni, fundadora da franquia. "É ótimo ter nossa marca perto desses consumidores."

Apesar do discurso polido, a iniciativa da nova empreitada nasceu da percepção de mercado do casal paulista de empresários Wendel Oliveira e Aldrey Basio, franqueados da Sorridents desde 2006. Eles começaram a considerar a ideia de abrir uma filial em Paraisópolis depois que diversos moradores da comunidade passaram a se tratar em sua franquia do Morumbi. "Foi uma decisão exclusivamente comercial", diz Oliveira, que começou a procurar local para a nova unidade no final de 2010. O empresário, na verdade, sentiu no dia a dia de seu negócio uma tendência que as estatísticas vêm apontando nos últimos tempos. Levantamento feito pelo instituto Data Popular, no final de 2010, aponta que as classes C e D representavam um mercado consumidor de R$ 834 bilhões.

"Somos a cara de um novo Brasil, que está começando a ter acesso a produtos e serviços mais caros", afirma Gilson Rodrigues, presidente da Associação dos Moradores de Paraisópolis. Esse acesso, permitido pelo crescimento da renda dessas faixas de consumidores, está sendo facilitado pelas próprias empresas, antenadas com as possibilidade de explorar o mercado emergente. Atualmente, Paraisópolis já conta com uma loja da Casas Bahia e agências do Bradesco e do Banco do Brasil. De acordo com Rodrigues, outros grupos como as empresas de telefonia TIM, Claro e Vivo, e a fabricante de cosméticos O Boticário também já manifestaram seu interesse de estar mais próximos dos 100 mil moradores de Paraisópolis. "A presença dos bancos é a prova concreta da maturidade econômica dessas áreas", afirma Hideraldo Leitão, gerente-geral da unidade de gestão de canais do Banco do Brasil.

Em Paraisópolis, a primeira grande empresa a desbravar o terreno foi a Casas Bahia, em novembro de 2008. "Sempre trabalhamos a serviço das classes populares e para nós foi um movimento natural", diz Michael Klein, presidente do Conselho de Administração de Globex, holding que abriga a marca Casas Bahia. Segundo ele, a loja da favela paulistana está entre as de maior venda na cidade de São Paulo. A empreitada deu tão certo que até dezembro a Casas Bahia pretende repetir a dose na Rocinha, na zona sul do Rio de Janeiro. Na capital carioca, no entanto, a empresa de Klein não será a pioneira. Lá, a TIM começou a dar as caras em 2007, quando inaugurou uma loja no Complexo do Alemão. A filial é tocada por um morador responsável também por uma distribuidora de chip e recarga, que conta com 40 funcionários e atende 30 comunidades cariocas.

Outra iniciativa da operadora foi se associar a uma cooperativa de transporte e à Supervia, a companhia de transporte ferroviário do Rio de Janeiro, para comercializar seus chips e serviços em suas vans. "Tivemos de estudar os hábitos dos moradores para descobrir as melhores formas de vender nossos serviços", diz Fernando Mota, diretor comercial da TIM no Rio de Janeiro. Uma das soluções que o executivo encontrou para isso foi veicular campanhas publicitárias em tevês, rádios e jornais comunitários. "O grande desafio das empresas é entender esses consumidores e entrar no cotidiano deles", afirma Eduardo Ayrosa, professor de marketing e comportamento do consumidor da Fundação Getulio Vargas. "É um público ainda pouco conhecido e que só se conhece tendo contato."

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